terça-feira, 19 de maio de 2009


Passe de autocarro de quando o meu pai andava na telescola. Na fotografia, tinha 9 anos.


O meu pai vivia na Cerejeira, uma aldeia situada à beira de uma ribeira. Ele contou-me que, quando andava na escola primária, tinha de levantar-se às sete horas e depois andar 3 km a pé, até chegar à escola. No entanto, não havia nenhuma ponte a ligar a aldeia à escola, apenas um pontão de madeira, onde era preciso a ajuda de um adulto para o atravessar, já que, no Inverno, chovia muito e a ribeira ficava cheia. A escola era das 8:30 às 15:00 horas e tinha que se levar o almoço de casa. Durante o período de aulas, a alimentação era à base de pão e de fruta que era abundante na aldeia. As vacinas eram levadas no Alvito da Beira, sede da freguesia, mas até aos 10 anos, o meu pai nunca foi ao médico, pois também não havia acesso a médicos nem a hospitais. Quando tinham constipações, dor de dentes ou febres, os medicamentos eram receitas caseiras feitas à base de ervas.
Comia-se o que se produzia, apenas se comprava massa e arroz, a alimentação era à base de hortaliças e cereais. O vestuário comprava-se e passava dos mais velhos para os mais novos, tal como o calçado. Não haviam transportes, apenas se andava a pé nem havia meios de comunicação, apenas um telefone público que se encontrava na mercearia, quando se queria ligar para uma terra mais longe, não eram chamadas directas, para além de que não havia mais nenhum meio, nem acesso a jornais. Na escola, não havia livros, apenas um livro que a professora tinha, um para cada ano, pois na mesma sala estavam alunos da 1.ª à 4.ª classe, e apenas havia uma professora para todos os anos. Quando os alunos se portavam mal, quando não faziam os trabalhos de casa ou quando tinham um erro num ditado, levavam reguadas.
Nos tempos livres, jogava-se à malha, jogos tradicionais e à bola e, no Verão, aos Domingos, iam para a ribeira. Nos outros dias da semana, os tempos livres eram ocupados a ajudar os pais na agricultura e com os animais. Nas férias, iam guardar o gado e colher resina, que era uma das fontes de rendimento que havia, quase a única.
Também não havia casa de banho, água canalizada, nem luz eléctrica, a casa de banho era na rua. No Inverno, tomava-se banho de água fria de semana a semana e, no Verão, iam tomar banho todos os dias na ribeira. A água para se confeccionarem os alimentos tinha que se ir buscar água à fonte, que ficava a uns metros de casa do meu pai. A única luz que havia era a de uma candeia alimentada a azeite e de um candeeiro a petróleo, que apenas usavam para estudar e depois apagavam logo, pois o petróleo era caro.
Em 1979, o meu pai andou na Telescola (5.º ano), na Sobreira Formosa, que ficava a 10 km da aldeia. Andar de autocarro, naquela altura, era um luxo, pois apenas se andava de carro puxada por dois bois. Dois bois pertenciam a 5 ou 6 famílias, porque era mais fácil de suportar, e eram alimentados e tratados uma semana por mês por cada dono. As aulas era dadas pela televisão e depois uma professora explicava a matéria, duravam das 13:00 às 18:00 horas. Da parte da manhã, o meu pai ia trabalhar: apanhar azeitona, apanhar resina ou trabalhar nas hortas e guardar os animais. As principais fontes de rendimento eram a apanha de resina, a venda de cereais, e de azeite, que era feito no lagar da aldeia movido a água.
Nos Domingos, ia-se à missa ao Sobrainho dos Gaios que ficava meia hora a pé.

Patrícia Silva